Percebe
que dentro de mim algo mudou?
É esta lacuna, esse espaço em branco
que divide o tempo e o espaço entre você e eu. Foi como um corte lento e
profundo, visceral e devastador. Metodicamente fez-se a incisão, lâmina afiada
perfurando as camadas mais profundas da pele, perpassando minhas costelas até
encontrar o músculo-mor.
Meu amor, anestésico mortal, impediu
que eu percebesse o que realmente aconteceria antes que o estrago se fizesse
efetivo. Essa poesia de cego, você não viu.
Incisão feita, seus dedos avançam
como cobras para dentro de meu peito, tomando-o para si.
Sente?
Agora
pulsa em suas mãos.
Diante
meus olhos, diante daquele que outrora fora seu dono.
Em
seu rosto não há nenhum sorriso sádico tampouco nenhuma expressão culpada.
Fizeste tudo como se cumprisse um ritual, um costume, um hábito. Talvez
realmente fosse isso, essa vontade voraz de ter nas mãos essa granada – esse último
suspiro. É a perca de um traço da sua essência, ou talvez uma nova moldagem da
mesma.
Olho
para o meu peito, para o espaço vazio donde o líquido escarlate brota e escorre
por meu corpo, e tenho total consciência de que tal estrago não pode ser
revertido, que a marca permanecerá ali até o fim do registro do meu tempo.
Vejo-o virar as costas antes que eu possa dizer palavra – já não há o que ser
dito. Antes que suma da periferia da minha visão uma certeza, cega e mordaz, se faz latente
dentro de mim; irei toma-lo de volta, resgatar o que é meu nessa batalha de
deuses e monstros.
O
que eu verdadeiramente quero é a inocência perdida.
"Untouchable", Kyle Thompson |
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